Dono de um dos estilos mais ácidos e particulares do rap nacional, Matheus Coringa prepara-se para o lançamento de seu álbum visual, intitulado “El Torto“, previsto para 2020. Ontem, o Mc nos deu um gostinho do que podemos esperar deste trabalho, nos presenteando com o genial single “PANE“. Integrante do álbum como uma faixa bônus, o som enfrentou censura antes mesmo de vir a público, graças a críticas em sua arte de capa ao atual presidente Jair Bolsonaro,
O destaque de “PANE“, além das linhas muito bem escritas, é seu visual. O clipe é um stop motion analógico, fruto de 4500 fotos feitas em 8 dias de estúdio. Com direção de Eduardo da Matta e Mateus Cony, este já pode ser considerado um dos melhores trampos audiovisuais do ano, e além de sua qualidade técnica, ele casa muito bem com o conceito artístico utilizado pelo MC. Com caráter subversivo, este clipe ilustra de uma forma figurativa a transição de Matheus para Coringa, fazendo diversas críticas a cena do rap e o momento político do país, de forma bem suja, “agressiva” e contundente, assumindo uma postura antagônica a isso tudo, assim como o personagem dos quadrinhos, sempre referenciado por Matheus em seus trabalhos.
Musicalmente falando, o som não foge à estética já utilizada pelo artista. Com um boombap assinado pelo produtor mexicano, Gordo Jazz, e mix/master na conta do Ogrow Beats, Matheus chegou pesado nas linhas. Passeando por egotrip, referências pop, ao próprio rap e sociológicas, além de críticas fortes ao imperialismo e ao atual governo brasileiro, ele demonstra toda coesão lírica e versátil de um bom MC. Posicionando-se como artista talentoso e importante da cena underground e também como ser político e social, Coringa distribui o caos ordenado que só ele sabe fazer.
Se eu sou um gênio
Eu queimei tua lâmpada
O Thomas Edison era um pilantra
Ele sampleou tudo de outro
Ou o Tesla que foi uma anta?! (PANE)
Matheus Coringa mais uma vez chegou sem medo e nos deu um dos melhores singles do ano, tanto musicalmente quanto visualmente, sendo exemplo do quanto originalidade e posicionamento são importantes em qualquer tipo de expressão artística. “PANE” não é apenas sobre como ele se vê diante da cena e da sociedade, e sim como deve-se agir e ir contra uma direção contraditória ao seu próprio discurso. A intenção é causar realmente um desconforto, fazer pensar até que ponto vale manter-se ao padrão, mesmo que ele seja predatório e muitas vezes preconceituoso.
Gerando mais perguntas do que respostas, “PANE” nos faz pensar até que ponto o lugar que nos incluímos, seja como público, artista ou cidadão, nos deixa confortável a ponto de fecharmos os olhos e ouvidos para o que acontece fora de nossos grupo sociais.