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Filosofia e arte, conheça o trabalho de Raplosofo

É redundante dizer que o Rap é retrato da vida do MC e que as letras podem ser baseadas no que ele vive. Como por exemplo, um estudante de Filosofia que insere sua vida acadêmica fortemente em suas músicas. Esse é o caso de Matheus Pedroso a.k.a Raplosofo, natural de Caçapava do Sul (RS), residente de Santa Maria e estudante de Filosofia da UFSM.

Chegando com seu trabalho de estreia, o EP “Venda Sua Arte, Não Venda Sua Alma”, lançado na última segunda-feira (06). O trabalho que possui oito faixas, conta com produções de Dapper e Kami, ambos beatmakers do coletivo San Carlo Mob, que Raplosofo faz parte. Através das rimas, apresenta suas experiências pessoais, sua realidade como jovem negro no Brasil e questões sentimentais do dia a dia, tudo isso aliado ao seu estudo filosófico.

“Acredito que a arte e a reflexão poética, às vezes, são mais transformadoras que a própria política. Por isso, incentivo as pessoas a deixarem aflorar seu lado artístico e vendê-lo, sem jamais esquecer o impacto que o brilho da alma pode ter para os outros” (Raplosofo)

Com forte influências dos MCs americanos Earl Sweatshirt e Vince Staples, Raplosofo alia seu flow, métrica e escrita, de um jeito próprio. Através da sua identidade musical, ele proporciona uma obra não apenas lírica, mas com ótima qualidade técnica, tanto musical quanto escrita.

Os conceitos filosóficos contidos no trabalho não são jogados de forma vazia, pelo contrário, são apresentados de maneira bem concisa. Mostrando sua vivência em conjunto da filosofia, Raplosofo dá a aplicação da reflexão filosófica na vida. Ele aproxima o ouvinte da realidade ao mesmo tempo em que demonstra como a filosofia se apresenta nas áreas de nossa existência.

Algumas ideias transmitidas no trabalho valem muito a pena ser destacadas. Podemos começar com o nome do EP, “Venda Sua Arte, Não Venda Sua Alma”, que pode parecer algo contraditório.
A arte de qualquer pessoa contém sua essência, assim como quem ela é, é uma representação física de seus pensamentos, ideias, sentimentos, uma forma de apresentar “fisicamente” o que está na aura do ser. Pensando dessa forma vendendo- a, não estaríamos vendendo a nossa alma? Bem, a resposta é não.

Durante a primeira faixa do trabalho, “Através da Fumaça”, é reproduzido um áudio do filósofo brasileiro Clovis de Barros Filho, em que ele fala sobre o Existencialismo, do filósofo francês Jean- Paul Sartre.

Essa filosofia diz que nossa essência é formada de acordo com o que já vivemos. Segundo ela, o ser humano por possuir consciência de sua existência, tem liberdade para fazer de si o que quiser.
E tratando dessa liberdade e o que nos faz “existir”, que o EP se desenvolve.

“A caminhada é longa
Citou BK que o soldado não tomba
Eu cito: o africanizado aqui afronta” (Através da Fumaça)

Para Sartre, o responsável pelas ações do homem, é o próprio homem. Dependendo da forma que você interprete essa afirmação, podemos adquirir vários pontos de vista.

Raplosofo, se tratando de um jovem negro no Sul do Brasil, entende sua realidade, o que passa na sua vivência e o que precisa fazer para sobreviver a tudo. Tratar de um discurso como de Sartre, pode acabar soando um pouco meritocrático ( algo que com certeza, não queremos em um rap).

Porém quando o MC se refere como dono de suas ações e responsável por suas escolhas, ele está se referindo em como ele se relaciona com o mundo, em como ele lida com o eu e com os outros.

“Com os pés no chão
De olho na realidade
Atento a falsidade da cidade
Tecendo linhas que se unem pela arte” (Wu Tang Style)

Tomando conhecimento de todos esses conceitos, o título do trabalho faz ainda mais sentido dentro da obra. Vender a arte e não vender a alma, foi a forma que Raplosofo encontrou para reagir à sociedade em sua volta.

Quando ele retrata o mundo em que vive e suas experiências, ele está mostrando quem é, sua essência. Vende- la é uma escolha, uma forma de sobreviver nessa cidade cruel, e crer que isso é algo real, mantém a alma viva.

“Ecoa a Arte Ancestral
Dinheiro é mais que motivacional
É muito mais que algo cultural” (Locutores do Bragaddócio)

A arte já é presente na história da humanidade desde tempos primórdios, como por exemplo a arte rupestre. Com isso vemos que se expressar trata – se de uma necessidade humana. Raplosofo também sabe muito bem disso, e usa sua arte para dar um panorama total de quem é.

Um MC que não fala só de sua vida, de uma forma simplória e vazia, mas sim como alguém que entende todos os aspectos da dela e os valoriza.

A arte não imita a vida, ela é uma demonstração do viver, e expressar isso que nos define e somos totalmente responsáveis por exibir a nossa essência.