Em tom de ironia, Majda Asad, Viic Oliveira e Amnah Asad lançam o videoclipe de “Desesperadas”, um trabalho que, apesar de crítico, exalta a potência e luta das mulheres. O refrão, irônico, contesta a visão que a sociedade tem da mulher, ao achar que correta é aquela que “obedece” e cuida do lar. A produção musical é de Vibox Beats e o videoclipe ficou sob a execução da Gang Prod., produtora formada integralmente por mulheres. A coreografia é do corpo de dança de mulheres cis e trans, Força Queens, composto por Talyinda, Daia Benites, Thamy Mille, Kaue Souza, Vitoria Nago, Jhey Oliver e Babi Vieira.
No videoclipe, as artistas passam por um manicômio e voltam ao passado para conseguir entender o presente. No decorrer da situação, cada uma se depara com um enorme corredor, onde cada sala remete a um tipo de doença social que acomete as mulheres, como padrões de beleza, violência e a imposição ao casamento, a qual falam ironicamente no refrão da música. O roteiro do clipe, muito bem detalhado, mostra o momento de cura e liberdade de escolha e entendimento de cada uma dessas mulheres e ao final do clipe, festejam juntas.
A canção faz referências a escritora nordestina Nísia Floresta e a Nannerl Mozart, irmã do icônico músico austríaco. Ambas foram obrigadas a se casar por pressão familiar, enquanto poderiam estar desenvolvendo seus talentos. “Desesperadas” é um grito contra a mentalidade tacanha que ainda permeia a mente de muitas pessoas. Além delas, referência também a africana Mariama Bah, que fugiu aos 24 anos, da Gâmbia para o Brasil, com o intuito de evitar o casamento com um familiar e assim manter os estudos futuramente.
“Emboscada é nascer na sociedade onde a perspectiva masculina enraizou nossas verdades”, diz Majda Asad, também conhecida como Magi, nos primeiros versos da música e tem um motivo. Ela aprendeu desde cedo a combater visões de mundo preconceituosas. Descendente de árabes e indígenas, é uma frequentadora assídua de fóruns sociais e passeatas contra a opressão e as injustiças.
A artista, que é natural de Porto Alegre (RS), explica que ouviu diversas histórias de opressão e guerra contadas pelo pai, que é árabe palestino, enquanto a mãe, que é brasileira, acreditava que a avó de Magi, que era índia, foi vítima de estupro por um castelhano.
“Quando a cultura árabe e a brasileira começaram a atritar dentro da minha casa, acredito que eu deva ter iniciado internamente minha carreira. Entre minha irmã escapar de casamento arranjado e a gente poder estudar e ser independente, eu, minha mãe e ela, tivemos que travar uma guerra para pedir independência do patriarcalismo e opressão machista a qual estávamos subordinadas”, conta.
Magi, sua mãe e irmã, Amnah Asad, tinham um lema: “Quem não reage, rasteja”. Enfrentaram toda a situação em casa, unidas, a artista explica que não foi fácil. “Foi tudo muito dolorido e seco, a opressão que imperava lá em casa foi embora, mas junto com ela foi o nosso sustento”. Esse foi um dos impulsos que ela teve para conseguir ajudar a família a lidar e enfrentar o preconceito causado pela sociedade.
Após alguns anos e já morando em São Paulo, ela começou a dar monitoria em um projeto com jovens e adolescentes de periferia. “Nesse projeto eu costumo conversar individualmente com eles sobre a vida e o mundo de cada um. Me lembro de um dia voltar de lá com uma bola engasgada na garganta por ter escutado de uma das alunas algo parecido com o que eu já tinha passado”.
Como brasileira e filha de árabe, quis passar na música um olhar que mostrasse que, seja no Ocidente ou no Oriente, as histórias se repetem, apoiadas por diferentes religiões e leis, e impulsionadas secularmente. “Tudo isso impulsionado secularmente pela dependência financeira da mulher exclusiva ao matrimônio, aliada até hoje a uma cultura que fomenta o amor entre as pessoas apenas pelo viés romântico e imbuído de uma dependência emocional”, finaliza.
Confira o videoclipe!