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Anderson Peixoto lança Frágil: um EP com mensagens fortes

O EP “Frágil” começa com a ideia de que tudo é finito e mutável. A frase do recorte do escritor português José Saramago (descobri que era ele apenas depois de Anderson me contar), quando diz que “tudo vive o tempo que tem que viver”, fala muito sobre nossa fragilidade. Essa mensagem pode parecer um pouco agressiva e desanimadora.

https://www.youtube.com/watch?v=4pth7CtwJOY

Olhando por outro lado, ela é um impulso. Um convite para a humildade. Nos convida a refletir sobre o fato de que não somos invencíveis e que podemos viver melhor caso reconheçamos isso.

Quando perguntei para o Anderson sobre o recorte, ele respondeu:

“Acho que ele sintetiza a ideia do EP, essa ideia de que tudo acaba, tudo é frágil. Ele leva o que eu pensei pro disco pra um âmbito maior, a relação com o universo e tal. No EP eu rimei mais sobre relações pessoais, é um complemento. Partir do todo e ir aproximando. Na época eu tava lendo um livro dele (José Saramago), queria esse pensamento pro EP, aí procurei por entrevistas e áudios, até chegar nesse documentário.”

Frágil

https://www.youtube.com/watch?v=VxTCVF66lks

Na faixa homônima do disco, Anderson denuncia a fragilidade de artista. Quando fala sobre a “folha vazia que lembra o fim que há de mal em mim”, isso se traduz. Aqui, a folha vazia pode representar a falta de criatividade do artista para compor, o que causaria seu fim.

Logo depois ele diz, quase que como uma súplica que acha que “é só uma fase, como os sons que eu escrevo e já não lanço mais”. A sinceridade nesses versos admite algo que assombra muitos artistas. A falta de contentamento com a própria arte.

Porém, quando o MC me explicou sobre o real significado da faixa, vejo que eu estava errado:

“Frágil foi a última música do EP que eu escrevi. Acho que fiz pelo menos 3 sons que descartei até chegar nela, e a ideia é essa. Quando eu falei sobre sons que eu escrevo e não lanço mais, não é sobre autocrítica, mas sobre os sons que serviram pra um momento específico da minha vida, que lançar depois não tem tanto sentido pra mim. Nem tudo tem que ser público. O motivo do EP todo é esse, eu precisava fazer algo pra sair, se não ia desistir do resto.”

15°

Nessa faixa, o MC fala muito sobre tempo. Esse tempo, que na minha percepção tem muito a ver com o passado, me remete à faixa anterior.

https://www.youtube.com/watch?v=oicvdtXo6zE

Quando ele diz “no reinado do tempo, num golpe de estado. Para que eu volte a dormir, esqueça do passado”, coloca seu passado como algo que domina o seu interior e, segundo ele mesmo “quem manda, nem sempre vai estar do seu lado”.

“15º é sobre uma série de coisas na real, não tem um tópico central, além do tempo. Nela falo sobre o peso que o tempo tem sobre as coisas mesmo, que volta à ideia da intro. ‘Faz tempo que eu não tenho tempo pra vender minha vida’ é sobre emprego fixo, faculdade, e o modo que essas coisas acabam levando a energia que podia ser usada em outra coisa.”

Chess Rec.

A letra de “Chess Rec.” é uma visão sobre a indústria. O nome, Chess (xadrez), é relacionada, por ser um jogo, com o Rap Game.

https://www.youtube.com/watch?v=MCf4rc8QUvA

Ele fala sobre os “heróis sem grana para overdose” (uma referência muito bem colocada a Cazuza), evidencia a invisibilização de muitos artistas por conta do jogo criada pela indústria milionária da música. Anderson diz isso pouco antes de indicar que artistas seriam apenas peças de um jogo.

Durante a música, ele transita entre coisas desse mundo da fama e coisas do “mundo real”. Gostei muito dessa dualidade exposta de maneira que me sugeriu a olhar para o jogo como uma espécie de máscara da realidade (não sei se fui muito longe).

“Acho que trazer a ideia de uma fragilidade da indústria, citando alguns nomes, colocando exemplos e tal, é bem sinistra, porque eu já havia falado sobre uma relação de fragilidade minha com o que eu escrevo, e depois com o tempo. O game é sobre como as pessoas interpretam. No meio disso coloquei umas ideias de cunho mais social, que eu não costumo fazer. Em relação à letra, foi a única que eu precisei estudar algo específico pra fazer, as outras são mais naturais.”

Quem Sabe no Trópico

https://www.youtube.com/watch?v=QMJXMGoixcA

Confesso que essa música me trouxe uma mistura de sensações sem uma conclusão consistente. Ela se inicia em uma espécie de love song de contemplação. Só que depois se transforma em uma contemplação interior, na qual Anderson fala sobre se distanciar de tudo para fazer coisas como pensar em “96”, citada pelo artista como o “nascimento da tragédia”.

“Quem Sabe no Trópico” tem 2 pontos, nessa acho que você acertou. Hahaha, é sobre planos, meio que depois de pensar todas as outras faixas, queria algo mais suave. É um repouso, no disco não tem nada sobre relações amorosas, é um toque sutil. Descansar com alguém, ir pra longe, Belchior. Parece brisa de hippie, não to certo quanto a ter 5 filhos. Tive um sobrinho e fiquei feliz com isso, aí saiu.”

Anderson Peixoto tem 22 anos de idade, e a relação dele mesmo como uma tragédia reforça o lado melancólico de “frágil” Todo o tom que reforça a ideia de fragilidade, para mim, foi um convite para ser frágil. Eu adorei aceitar.

Pós

“Eu pensei em “pós” como um descanso mesmo. O beat é do primeiro som solo que eu lancei, em 2017, “yasunari”. Serviu meio que como uma lembrança pro pessoal que já ouviu. “

https://www.youtube.com/watch?v=Kv9ZqGeYxW8

Nessa faixa, só o beat e o silêncio. O mais engraçado é que foi essa que me instigou a escrever sobre o trabalho do Anderson e conversar um pouco com ele sobre cada letra.

Realmente o silêncio tem um poder muito grande na música e na vida. Ele nos dá tempo de refletir, pensar e repensar. Penso em como o rap me deixa feliz quando é liricamente rico.

O EP é bem curto e, mesmo assim, me ofereceu momentos de questionamento muito válidos. O pós é realmente importante, até porque, sempre vivemos o futuro.

E, para mim, numa obra em que, em mais de uma faixa, o passado reina e dita as regras do que acontece no interior, o “pós” é uma esperança de melhora.

O EP

O nascimento desse trabalho, feito pelo MC de Santo André (SP), é muito interessante:

“Desde 2017 eu tô criando um outro EP, do meu grupo, o Ofícioclan. Durante esse processo, depois de escrever a minha parte em todas as faixas, eu continuei escrevendo bastante, então vi que podia fazer um projeto sozinho, mais pra aliviar o estresse do outro trabalho, que acaba demorando mais porque depende do processo criativo de 3 pessoas diferentes. Sozinho eu podia ir criando no meu ritmo, a ideia era que saísse depois, mas acabou vindo primeiro.”

O EP foi lançado pela PurpleGang, no dia 11/02. Além do YouTube, “Frágil” está disponível nas principais plataformas de streaming.

Ficha técnica:

Todas as faixas foram compostas e gravadas por Anderson Peixoto, com mixagem e masterização de Lucvs LK.

Os instrumentais, em ordem, são de Alã, Jnr Beats, 808 Luke, Mind, Borge$ e Jr. Branko.

Fotografia da capa por Anderson Peixoto, encarte e direção de arte de Lucas

Faixas:

1 – Intro Prod. Alã

2 – Frágil [ft. Pedro Casttro] Prod. Jnr Beats

3 – 15º Prod. 808 Luke

4 – Chess Rec. Prod. Mind 06:44

5 – Quem sabe no trópico Prod. Borge$

6 – Pós Prod. Junior Branko 10:09

Gostou do EP? Então veja mais sobre o trampo de Anderson Peixoto no perfil do Instagram dele.